Sobre este romance, Italo Calvino escreveu: "O peso da vida, para Kundera, está em toda forma de opressão. O romance nos mostra como, na vida, tudo aquilo que escolhemos e apreciamos pela leveza acaba bem cedo se revelando de um peso insustentável. Apenas, talvez, a vivacidade e a mobilidade da inteligência escapam à condenação - as qualidades de que se compõe o romance e que pertencem a um universo que não é mais aquele do viver" (Seis propostas para o próximo milênio). O livro, de 1982, tem quatro protagonistas: Tereza e Tomas, Sabina e Franz. Por força de suas escolhas ou por interferência do acaso, cada um deles experimenta, à sua maneira, o peso insustentável que baliza a vida, esse permanente exercício de reconhecer a opressão e de tentar amenizá-la.
Ah,
como eu queria ler esse livro! Esse título a muito tempo já me chamava atenção,
no começo do ano quando decidi ler um autor de cada continente aí estava a
minha chance de finalmente lê-lo, afinal o senhor Milan é Europeu mais
especificamente nasceu na Tchecoslováquia (hoje República Tcheca).
“O amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor (esse desejo se aplica a uma multidão inumerável de mulheres), mas pelo desejo do sono compartilhado (esse desejo diz respeito a uma só mulher).”
Eu
não sei bem o que eu esperava desse romance, uma vez que eu nem sabia ao certo
sobre o que se tratava o plot, mas de tanto ouvir falar sabia que queria ler e
não me arrependi. Já adianto que essa não é uma leitura fácil, se você está
acostumado com histórias mastigadinhas, talvez você precise se desafiar, para
só então encarar esse livro, mas posso dizer que valerá a pena.
“Não se brinca com as metáforas. O amor pode nascer de uma simples metáfora.”
O
plot é dividido em 7 partes, a narração não nos conta só o que acontece, mas
também os pensamentos do narrador/autor sobre as situações vividas; a costura
dessas partes são 4 personagens principais. Tomas é um médico que vive sem
qualquer compromisso, praticando o lema do Zeca pagodinho, tipo deixando a vida
levá-lo, de mulher em mulher, ele vai aproveitando e sempre
compartimentalizando em “caixinhas” BEM separadas o que significa Amor e o que
significa Sexo.
Tereza
tem inúmeros problemas familiares e desejos, mas sempre os reprime, porque
geralmente deposita suas expectativas nos outros, está sempre procurando
tornar-se culta para compensar o problema de autoestima com o corpo. Esses dois
se envolvem e mantem uma relação amorosa, Teresa fazendo o famoso “papel de
trouxa” da nossa atualidade e Tomas “seguindo o baile”.
Outros
dois personagens que compõe a história são Sabina que é pintora e tudo o que
Teresa não é, pois Sabina é completamente empoderada e já foi uma das amigas
coloridas do Tomas (em resumo A Outra). Para completar o quarteto temos Franz,
um professor universitário, um homem casado que tem uma filha e mantém um
relacionamento sério e não oficial com a Sabina (é tipo todo mundo traindo todo
mundo) o “Amante” da “Outra”.
Esses
“casais” em um momento o outro irão se relacionar e sem dúvida são as
características de cada um que sustentam as diferenças, pesos e medidas que o
autor usa pra sustentar a tese de existência da vida, mesmo sem nenhuma
expectativa no início me peguei acompanhado relações entre pessoas que se amam
e que se traem, sobretudo que vivem, mais do que acompanhar, eu torci por eles.
“Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. No entanto, mesmo ‘esboço’ não é a palavra certa porque um esboço é sempre um projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é o esboço de nada, é um esboço sem quadro.”
Existe
um posicionamento político como pano de fundo das histórias que vemos se
desenrolar, até porque os personagens são levados a tomarem posicionamentos
políticos por conta dos fatos históricos que realmente aconteceram (a primavera
de Praga) quando a Rússia invadiu a Tchecoslováquia, mas se eu tivesse que
definir o que me chama atenção nessa história sem dúvida seria o quanto de
situações/questões filosóficas são retratadas, tudo envolto com muito erotismo.
Esse é um livro para quem não tem preguiça de pensar.
“Só o acaso pode nos parecer uma mensagem. Aquilo que acontece por necessidade, aquilo que é esperado e se repete cotidianamente é coisa muda apenas. Somente o acaso tem voz. Tenta-se ler no acaso como as ciganas leem no fundo de uma xícara os destinos deixados pela borra do café.”
Todas
as situações envolvem a dualidade de peso e leveza, do que é eterno ou que tem
prazo de validade, tudo sempre é embasado em pensamentos de filósofos que se
você não conhece já ouviu falar uma vez na vida e a grande questão é a leveza
que é tão positiva quanto o peso é negativo ou vice-versa.
“Não há nada mais pesado do que a compaixão. Mesmo a nossa própria dor não é tão pesada como a dor co-sentida com outro, por outro, no lugar de outro, multiplicada pela imaginação, prolongada em centenas de ecos.”
Terminei
o livro com a sensação de que não entendi tudo o que estava sendo contado,
talvez eu tenha entendido apenas uns 10% e ainda assim a história e a maneira
como é contada teve sucesso em me entregar uma experiência de leitura digna de
5 estrelas. Não tenho dúvida nenhuma de que é um livro que vou revisitar daqui
há algum tempo.
Livro: A Insustentável leveza do ser |
|